Eu morri ontem em Orlando
Nós morremos ontem em Orlando
Provavelmente
não haja mais muito o que ser dito sobre o massacre ocorrido na Boate Pulse, em
Orlando, nos Estados Unidos. E ainda assim muito teremos que falar sobre o
massacre ocorrido na Boate Pulse, em Orlando, nos Estados Unidos.
Eu
morri ontem em Orlando!
Não
apenas porque me identifico como homem gay, mas porque compartilho a
humanidade daqueles e daquelas que lá morreram, porque sou cristão e porque
minha fé me ensina que quando alguém sofre todxs sofremos.
Nós
morremos ontem em Orlando!
Não
apenas aqueles e aquelas de nós que não preenchem os requisitos da norma
heterocêntrica (incluindo pessoas auto identificadas como heterossexuais), a assim
chamada comunidade/população LGBTIQ, mas todxs que fazem parte da criação de
D*s, que são imagem e semelhança de D*s, pois foi essa imagem e semelhança que
foi morta.
E D*s morreu conosco!
E D*s morreu conosco!
Ainda
no sábado conversávamos sobre o significado de abominações no Levítico, os
motivos da destruição de Sodoma e Gomorra, as traduções de arsenokoitai e malakoi
(termos gregos) e do sentido de “contra a natureza” em Paulo. E pessoas eram
mortas em Orlando, ou nas ruas do Brasil, por causa da disputa pelo sentido
desses termos e dessas narrativas. Sim meus irmãos e minhas irmãs: enquanto
gastamos horas em discussões exegéticas e hermenêuticas sobre esses textos, o
evangelho da vida e da justiça se esvai pelo ralo e morremos todxs um
pouquinho. Não, não dá para resolver esse dilema com slogans fáceis como “amar o pecador e condenar o pecado”. Nós temos
o direito de sermos amadxs por inteiro! E não há pecado em nosso amor!
Também
não temos tempo para ficar discutindo se a motivação para o massacre foi mais
uma ou mais outra. Foram ambas e muitas mais. O terror que faz com que pessoas
LGBTIQ não saiam de casa com medo de sofrerem violência nas boates ou nas ruas
ou nas igrejas; o terror que faz com que mulheres não andem sozinhas na rua com
medo de serem estupradas; o terror de imigrantes que não ultrapassam as
fronteiras com medo da prisão e deportação ou até mesmo da morte; o terror de
quem teve suas terras e moradias saqueadas pelos grandes interesses econômicos
que sangram com juros, lucros e outras invenções em forma de commodities; o
terror de quem vê que o salário não vai chegar até o final do mês para comprar
comida e pagar as contas, de quem não pode adoecer porque não tem plano de
saúde; o terror... revestido, ou não, de religião!
Eu
morri ontem em Orlando!
Nós
morremos ontem em Orlando!
Assim
como morremos a cada dia nos quatro cantos do nosso país, na Palestina, na
Europa ou nos Estados Unidos. Nossa humanidade e nossa relação com o mundo que
nos cerca é roubada e não se trata de um debate acadêmico para saber quem, no
final, tem razão. É a vida que vai sendo morta em nossos corpos, no corpo do
mundo e no corpo de D*s, mesmo quando é feito em nome dEle.
D*s
morreu ontem em Orlando!
E
ressuscitará! Junto com todxs aquelxs que foram mortos em seu nome!
Enquanto
isso resistimos, lutamos e choramos a dor de termos sido mortxs... também em
Orlando.
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