Há uma crença generalizada de que o que “produz” homens gays é o fato de “serem diferentes”. Essa “diferença” é o que gera encantamento e até paixão por parte de muitas mulheres heterossexuais, pois buscam exatamente essa “diferença” em um possível parceiro, seja para satisfação sexual, seja para um relacionamento afetivo e emocional. Mas, do que se trata essa diferença?
A formação da identidade sexual de alguém (e a adoção de determinadas práticas sexuais que podem gerar uma autoidentificação a partir de categorias como “homossexual”) é o resultado de processos variados e complexos que envolvem questões biológicas, psicológicas e sociais, difíceis de explicar e equacionar – apesar das inúmeras tentativas de várias áreas de pesquisa científica devotadas a isso. Além disso, existe uma dimensão da experiência sexual de cada indivíduo que permanece na esfera do mistério. Como (e por quê?) explicar atração, desejo, prazer, paixão, vontade, e todos os outros sentimentos e sensações envolvidas no processo de viver a sexualidade humana? Fórmulas matemáticas e esquadrinhamentos estatísticos serão sempre insuficientes para mapear os cantos e redutos da sexualidade, sempre em movimento.
Isso é verdade tanto para homossexuais quanto para heterossexuais (usando apenas essas duas categorias, apesar de suas óbvias características limitadas e limitantes). As convenções, as regras, os tabus, construídos ao longo de séculos (embora não sejam historicamente unívocos) produziram a crença (até o momento generalizada em nosso contexto) de que a homossexualidade é um desvio. Definidas as formas (ou a forma, como alguns querem fazer crer, criando o mito e a fantasia de que existe “uma” heterossexualidade) de viver a sexualidade de maneira correta e “natural” (muito discutível essa categoria) – a chamada heterossexualidade hegemônica e compulsória – torna-se necessário explicar o(s) motivo(s) do(s) desvio(s). É assim que, mais recentemente, seguindo tendências em outras áreas e especificidades da identidade humana, se começou a falar das tais “diferenças”. No caso da homossexualidade a equação explicativa é a seguinte: uma pessoa (de várias maneiras) é “diferente”, logo ela é ou será gay.
Muita tinta e papel (ou muitos caracteres e bytes) foram gastos sobre essas tais “diferenças”. Muitas bandeiras e movimentos construídos em torno delas – muito justificáveis, diga-se de passagem. Várias idéias sobre o que fazer com essas diferenças também: corrigir, aceitar, respeitar, incluir, tolerar... Todo mundo é diferente, ninguém é igual; todo mundo deve ser tratado de maneira igual, mesmo sendo diferente... Grandes guerras e pequenos conflitos são travados cotidianamente por conta dessas questões, disputadas no corpo de cada pessoa que, por algum motivo, é considerado portador de alguma “diferença”. Não se trata de resolver essas questões agora, mas pensar o que existe na “diferença” de homens gays que faz “diferença” (lembrando que a categoria “homens gays” é aqui usada de maneira tipológica, não representando a realidade de todo e qualquer homem gay, seja essa uma autodefinição ou uma exodefinição).
Considerando-se que homens gays sejam, de fato, “diferentes”, parte-se do pressuposto de que esses homens são diferentes de outros da mesma espécie (há controvérsias), ou seja, homens heterossexuais – a partir de quem é definida a “diferença”. Essa diferença, comumente entendida como sendo relativa ao parceiro sexual (no caso de homens gays, outros homens), no entanto, deve ser entendida como uma diferença que se estabelece a partir do significado social que ter um parceiro sexual do mesmo sexo representa, e suas conseqüências práticas na vida e nos relacionamentos desses homens. O fato de terem relações sexuais com outros homens é apenas contingencial. O que produz a diferença é a forma como se compreendem e compreendem as suas relações cotidianas tendo em vista a identidade social que os define.
Dito de outra forma, o que “encanta” e “apaixona” muitas mulheres em homens gays são algumas características consideradas comuns a homens gays. Sensibilidade, cuidado, educação, elegância, gentileza estão entre essas características - a maioria delas “normalmente” associadas ao “feminino”. Essas características, no entanto, não estão ligadas ao fato de serem (ou estarem?) homossexuais – até porque nem todos os homens gays as ostentam. Elas são, em geral, desenvolvidas em um processo de ressignificação de o que significa ser “homem” – seja por um processo de autoavaliação e análise dos padrões de relacionamento instituídos, seja por força do espaço ambíguo para o qual são deslocados por imposição social, precisando reorganizar suas concepções sobre si mesmos e sobre as relações que estabelecem com outras pessoas, homens e mulheres. Estar exposto a preconceitos e discriminação, muitas vezes, faz com que desenvolvam a capacidade de entender os processos que geram essas formas de violência e não reproduzi-los em suas relações.
Ou seja, um homem não se “torna” homossexual porque, de alguma forma, é “diferente”. Mas um homem, sem dúvida, se torna “diferente” porque é homossexual. Isso não significa, sempre, uma diferença qualitativamente superior ou melhor, embora assim gostaríamos que fosse. Além disso, essa “diferença” não é prerrogativa de homens gays, mas pode manifestar-se inclusive em homens heterossexuais, e entusiasticamente gostaríamos que assim também fosse. A “diferença”, assim entendemos, é fruto de uma compreensão nova sobre as relações, particularmente naquilo que diz respeito a questões de gênero e sexualidade.
Considerando tudo isso, não é que haja menos homens disponíveis para mulheres heterossexuais (argumento comumente utilizado para tentar demover homens gays de sua suposta “opção” sexual). O problema é que continuam havendo poucos homens heterossexuais “diferentes” para cada vez mais mulheres (nem todas) conscientes de seus direitos e seu poder, em busca de novas relações e cada vez menos dispostas a “suportar” homens simplesmente “normais”. Por ironia do destino, é em homens gays que muitas mulheres encontram essa falta de normalidade, que se faz diferença.
A formação da identidade sexual de alguém (e a adoção de determinadas práticas sexuais que podem gerar uma autoidentificação a partir de categorias como “homossexual”) é o resultado de processos variados e complexos que envolvem questões biológicas, psicológicas e sociais, difíceis de explicar e equacionar – apesar das inúmeras tentativas de várias áreas de pesquisa científica devotadas a isso. Além disso, existe uma dimensão da experiência sexual de cada indivíduo que permanece na esfera do mistério. Como (e por quê?) explicar atração, desejo, prazer, paixão, vontade, e todos os outros sentimentos e sensações envolvidas no processo de viver a sexualidade humana? Fórmulas matemáticas e esquadrinhamentos estatísticos serão sempre insuficientes para mapear os cantos e redutos da sexualidade, sempre em movimento.
Isso é verdade tanto para homossexuais quanto para heterossexuais (usando apenas essas duas categorias, apesar de suas óbvias características limitadas e limitantes). As convenções, as regras, os tabus, construídos ao longo de séculos (embora não sejam historicamente unívocos) produziram a crença (até o momento generalizada em nosso contexto) de que a homossexualidade é um desvio. Definidas as formas (ou a forma, como alguns querem fazer crer, criando o mito e a fantasia de que existe “uma” heterossexualidade) de viver a sexualidade de maneira correta e “natural” (muito discutível essa categoria) – a chamada heterossexualidade hegemônica e compulsória – torna-se necessário explicar o(s) motivo(s) do(s) desvio(s). É assim que, mais recentemente, seguindo tendências em outras áreas e especificidades da identidade humana, se começou a falar das tais “diferenças”. No caso da homossexualidade a equação explicativa é a seguinte: uma pessoa (de várias maneiras) é “diferente”, logo ela é ou será gay.
Muita tinta e papel (ou muitos caracteres e bytes) foram gastos sobre essas tais “diferenças”. Muitas bandeiras e movimentos construídos em torno delas – muito justificáveis, diga-se de passagem. Várias idéias sobre o que fazer com essas diferenças também: corrigir, aceitar, respeitar, incluir, tolerar... Todo mundo é diferente, ninguém é igual; todo mundo deve ser tratado de maneira igual, mesmo sendo diferente... Grandes guerras e pequenos conflitos são travados cotidianamente por conta dessas questões, disputadas no corpo de cada pessoa que, por algum motivo, é considerado portador de alguma “diferença”. Não se trata de resolver essas questões agora, mas pensar o que existe na “diferença” de homens gays que faz “diferença” (lembrando que a categoria “homens gays” é aqui usada de maneira tipológica, não representando a realidade de todo e qualquer homem gay, seja essa uma autodefinição ou uma exodefinição).
Considerando-se que homens gays sejam, de fato, “diferentes”, parte-se do pressuposto de que esses homens são diferentes de outros da mesma espécie (há controvérsias), ou seja, homens heterossexuais – a partir de quem é definida a “diferença”. Essa diferença, comumente entendida como sendo relativa ao parceiro sexual (no caso de homens gays, outros homens), no entanto, deve ser entendida como uma diferença que se estabelece a partir do significado social que ter um parceiro sexual do mesmo sexo representa, e suas conseqüências práticas na vida e nos relacionamentos desses homens. O fato de terem relações sexuais com outros homens é apenas contingencial. O que produz a diferença é a forma como se compreendem e compreendem as suas relações cotidianas tendo em vista a identidade social que os define.
Dito de outra forma, o que “encanta” e “apaixona” muitas mulheres em homens gays são algumas características consideradas comuns a homens gays. Sensibilidade, cuidado, educação, elegância, gentileza estão entre essas características - a maioria delas “normalmente” associadas ao “feminino”. Essas características, no entanto, não estão ligadas ao fato de serem (ou estarem?) homossexuais – até porque nem todos os homens gays as ostentam. Elas são, em geral, desenvolvidas em um processo de ressignificação de o que significa ser “homem” – seja por um processo de autoavaliação e análise dos padrões de relacionamento instituídos, seja por força do espaço ambíguo para o qual são deslocados por imposição social, precisando reorganizar suas concepções sobre si mesmos e sobre as relações que estabelecem com outras pessoas, homens e mulheres. Estar exposto a preconceitos e discriminação, muitas vezes, faz com que desenvolvam a capacidade de entender os processos que geram essas formas de violência e não reproduzi-los em suas relações.
Ou seja, um homem não se “torna” homossexual porque, de alguma forma, é “diferente”. Mas um homem, sem dúvida, se torna “diferente” porque é homossexual. Isso não significa, sempre, uma diferença qualitativamente superior ou melhor, embora assim gostaríamos que fosse. Além disso, essa “diferença” não é prerrogativa de homens gays, mas pode manifestar-se inclusive em homens heterossexuais, e entusiasticamente gostaríamos que assim também fosse. A “diferença”, assim entendemos, é fruto de uma compreensão nova sobre as relações, particularmente naquilo que diz respeito a questões de gênero e sexualidade.
Considerando tudo isso, não é que haja menos homens disponíveis para mulheres heterossexuais (argumento comumente utilizado para tentar demover homens gays de sua suposta “opção” sexual). O problema é que continuam havendo poucos homens heterossexuais “diferentes” para cada vez mais mulheres (nem todas) conscientes de seus direitos e seu poder, em busca de novas relações e cada vez menos dispostas a “suportar” homens simplesmente “normais”. Por ironia do destino, é em homens gays que muitas mulheres encontram essa falta de normalidade, que se faz diferença.
Comentários
Postar um comentário